Sodoma e Gomorra são duas cidades que ganham destaque na
Bíblia, principalmente a primeira. Mas o destaque dado a elas, tanto no VT
quanto no NT é negativo e vergonhoso. Poucas cidades chegaram a um nível moral
tão baixo quanto essas duas. Mas uma consideração sobre os costumes de seus
moradores nos ensinará muito sobre o perigo que todos nós corremos.
Em Ez 16:49 a Bíblia destaca três pecados característicos de
Sodoma, que nos dão uma ideia da razão porque essa cidade se tornou exemplo negativo
de imoralidade deliberada. Veja cada um deles:
a) Orgulho – “Soberba”.
Os sodomitas eras soberbos e presunçosos, além de serem “maus
os homens de Sodoma, e grandes pecadores contra o Senhor” (Gn 13:13). A expressão
“grandes pecadores contra o Senhor” pode ser comparada com o que é dito sobre
Ninrode, que era “poderoso caçador diante do Senhor” (uma expressão que
realmente quer dizer: “poderoso caçador contra
o Senhor” – Gn 10:8-9).
Como Ninrode, que era orgulhoso, cheio de si e desafiava a
Deus em tudo, os sodomitas orgulhavam-se de si mesmos. Não havia neles qualquer
respeito pelo seu semelhante ou qualquer reverência para com o Senhor. Viviam para
satisfazer a si mesmos e confiando em si mesmos.
Quando Abraão recuperou as pessoas e bens que tinham sido
levados de Sodoma, ele recusou a oferta do rei de Sodoma porque sabia que o rei
diria, depois: “Eu enriqueci a Abrão” (Gn 14:23). O orgulho deste povo era
tanto, que seu rei seria incapaz de reconhecer que não foi capaz de recuperar
as pessoas e bens que foram levados, enquanto Abraão os recuperou com apenas trezentos
e dezoito empregados (Gn 14:14). Ele preferiria dizer, depois, que a riqueza de
Abraão veio de suas mãos, não do Senhor (Gn 15:1).
Este é um perigo claro e real na vida de qualquer pessoa que
deseja servir a Deus. Pode ser que o Evangelista pregue o Evangelho e, num
espaço curto de dias, várias pessoas sejam convertidas. Pode ser que o mestre
que tem o dom para ensinar transmita uma série precisa e preciosa de textos
difíceis da Palavra de Deus. Pode ser que a frente da casa de uma irmã fique
sempre cheia de vizinhos procurando seus muitos conselhos e cuidados. Pode ser
que o rapaz se destaque pela força e corpo atlético. Pode ser que a moça fique
em evidencia pela beleza e simpatia.
Tudo isso, sem dúvida, é muito bom. Mas há um sutil perigo
de orgulhar-se nas próprias realizações. Para evitar isso, sempre devemos
lembrar que não podemos “ir além do que está escrito, não vos ensoberbecendo a
favor de um contra o outro. Porque, quem te faz diferente? E que tens tu que
não tenhas recebido? E, se o recebeste, por que te glorias, como se não o
houveras recebido?” (I Co 4:6-7).
b) Opulência – “fartura
de pão”.
A região de Sodoma era muito fértil e próspera. Sua beleza e
fertilidade são descritas como sendo “como o jardim do Senhor”. Não é de se
admirar que Ló, tendo erguido seus olhos para aquela região, sentiu-se atraído
por ela (Gn 13:10-12). A terra ali não era árida e difícil. Pelo contrário, era
produtiva e rica para a agricultura e cultivo de rebanhos.
Como consequência dessa produtividade, não havia escassez de
comida em Sodoma. A “fartura de pão” caracterizava a cidade como segura. Reis inimigos
poderiam cercá-la e sitiá-la, mas ela permaneceria por muito tempo, apenas com
o sustento interno.
Esta fartura e tranquilidade material é um dos alvos mais
cobiçados no mundo, e também entre os filhos de Deus. Desejamos e buscamos
apaixonadamente o dia quando poderemos viver como aposentado antes de se
aposentar. Como seria bom poder trabalhar poucas horas no dia, num serviço que
exigisse pouco física e mentalmente e, ainda assim, o serviço render tanto que
nosso maior esforço seria desfrutar de muita riqueza e prosperidade!
Mas será que seria bom mesmo? Vejamos no próximo parágrafo.
c) Ociosidade – “abundancia
de ociosidade”.
Talvez, por causa da prosperidade que havia na região, as
pessoas em Sodoma não precisavam trabalhar tão arduamente para conseguir o seu
sustento. Praticamente tudo o que se plantava, produzia. E produzia em grande
quantidade. Depois, poderiam ficar longos dias sem se preocupar em plantar
novamente, nem preparar a terra para novo plantio.
Os cidadãos de Sodoma eram tão orgulhos e tão fartamente
supridos de alimentos, que se comportavam como se nada pudesse abalar sua
tranquilidade. Como o homem de Lc 12:16-20, a única preocupação deles era onde
guardariam sua fartura de pão e viver para dizer à alma: “tens em depósito
muitos bens para muitos anos; descansa, come, bebe e folga”.
Por ficarem tanto tempo sem ter muito o que fazer, os
cidadãos de Sodoma começaram a concentrar muita energia. A energia física,
emocional e mental que reuniam, não tinha muitos meios por onde ser liberadas. Não
havia válvulas de escape. E como acontece naturalmente, se o corpo não tem
meios legais e aceitáveis de liberar suas energias, ele logo desejará
liberá-las por meios ilícitos e imorais. Rapidamente Sodoma se tornou uma cidade
onde a promiscuidade sexual era praticada livremente. Isaias nos informa que os
cidadãos de Sodoma publicavam os seus pecados sem qualquer tentativa de esconder
ou dissimular (Is 3:9). No dia em que dois anjos vieram a casa de Ló, os homens
de Sodoma queriam envolver-se em imoralidade com eles abertamente (Gn 19:4-5). Judas
vai além, dizendo que os homens de Sodoma se entregaram a esta prática (Jd v.
7). Prostituição, para eles, não era mais uma coisa que deveria ser guardada de
olhos curiosos; tornou-se um estilo de vida.
Talvez esses detalhes respondam a pergunta acima. Será que
seria bom se todos nós tivéssemos tanta prosperidade material que não
precisássemos mais trabalhar? Não, não seria bom. Isso porque começaríamos a
inventar meios pelos quais nossas energias pudessem ser liberadas, e os
resultados seriam os mais vergonhosos possíveis. E por falta de algo mais interessante, começaríamos a inventar fofocas uns dos outros, pra gastar o tempo livre (I Tm 5:13). O ocioso peca contra seu próprio corpo, envolvendo-se em prostituição (I Co 6:18), "faz mal a si mesmo" (Is 3:9) podendo contrair uma doença, e prejudica os outros, envolvendo sua língua em conversações que não edificam (I Co 15:33).
Não importa o tipo de serviço que um cristão está, ele deve
evitar a ociosidade. Alguns trabalham em serviços pesados e braçais, que lhes
exigem muito fisicamente e lhes deixam exaustos no final do dia. Outros trabalham
pensando ou calculando o dia inteiro, e não veem a hora de chegar em casa e abrigar-se
nos braços da família. Alguns outros esmeram-se estudando a Bíblia para ensinar
aos seus irmãos, andam de casa em casa oferecendo literatura e falando de
Cristo, visitam doentes, carentes, desanimados e rebeldes, e algumas noites quase
não dormem, pensando nas ovelhas do Bom Pastor. Enquanto uns esforçam-se em serviços físicos e
materiais (que são legítimos e completamente aceitáveis), outros são separados
para servir ao Senhor em esferas espirituais (que também são legítimas e
aceitáveis).
Em todos estes casos, porém, uma verdade fica evidente: o
orgulho das próprias realizações, a fartura de tudo (sem nunca ter necessidade
de nada) e a ociosidade são extremamente perigosos!
Mas nós devemos, junto com a glória e virtude que Deus deu (II Pe
1:3), e “ponto nisto mesmo toda a diligência, acrescentai à fé a virtude... ciência...
temperança... paciência... piedade... o amor fraternal... caridade. Porque, se em
vós houver e abundarem estas coisas, não vos deixarão ociosos nem estéreis no
conhecimento de nosso Senhor Jesus Cristo” (II Pe 1:5-8).
Portanto, convém ser humildes e reconhecer que todo bom
resultado de trabalho vem do Senhor. Convém ser pacientes e reconhecer que
todo trabalho, mesmo que árduo e difícil, é uma válvula de escape para nossa
própria segurança. Convém ser diligentes em todas as coisas, reconhecendo que
ociosidade é uma das armas mais poderosas da carne.
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