quinta-feira, 23 de novembro de 2017

Os querubins

A palavra hebraica cherub ocorre 91 vezes no Velho Testamento, enquanto a palavra grega cheroubim ocorre apenas uma vez no Novo Testamento (Hb 9:5). Desde a primeira menção de querubins nas Escrituras, em Gênesis 3:24, até a sua descrição mais detalhada no livro de Ezequiel, aprendemos muitas e valiosas lições sobre estes seres que vivem tão próximos de Deus. É interessante notar que de todas as ocorrências de querubins nas Escrituras, sete vezes encontramos a afirmação de que “Deus habita entre os querubins”. Três vezes essa expressão é usada de forma figurativa, descrevendo os querubins que estavam sobre a arca da aliança (I Sm 4:4; II Sm 6:2; I Cr 13:6), e quatro vezes se refere a querubins reais, que estão no Céu, no meio dos quais “Deus habita” (II Rs 19:15; Sl 80:1; 99:1; Is 37:16). Além disso, duas vezes são registradas as palavras de Davi, quando afirmou que Deus “subiu sobre um querubim, e voou” (II Sm 22:11; Sl 18:10). Isto confirma a proximidade que os querubins têm da própria presença de Deus. O Senhor está no meio deles.

(...) Quanto à função que os querubins exercem, as Escrituras mostram que eles têm uma ligação direta com a santidade e justiça de Deus. Eles são agentes do trono dispostos a executar o juízo divino sobre os atos pecaminosos dos homens. A primeira menção de querubins está relacionada à expulsão de Adão e Eva do jardim. Querubins foram colocados ao oriente do jardim, bem como uma espada inflamada que girava ao redor (Gn 3:24). Simbolicamente, os querubins estavam também presentes no Tabernáculo, em três lugares diferentes. Sobre isto, William J. Watterson diz:

“Na cortina que formava a porta do átrio e na cortina que formava a porta da tenda, não havia querubins. Eles estavam somente nas cortinas que formavam a própria tenda, no véu que dividia esta tenda, e na arca. Como a tenda era coberta com peles de animais, não seria possível ver os querubins de fora da tenda. Era somente ao se aproximar da arca, que simbolizava a presença de Deus, que os querubins seriam visíveis”.

No jardim do Éden o acesso estava impedido, mantido assim pela presença dos querubins. No Tabernáculo o acesso à presença de Deus também estava impedido, simbolizado pela figura dos querubins no véu interior. A única pessoa que podia, uma vez ao ano, passar por aqueles querubins era o sumo sacerdote, que entrava com sangue em suas mãos (Hb 9:6-8). Isto é uma figura do Senhor Jesus, o Homem que entrou por nós: “Visto que temos um grande sumo sacerdote, Jesus, Filho de Deus, que penetrou nos céus, retenhamos firmemente a nossa confissão” (Hb 4:14). Ao penetrar nos céus o Senhor Jesus não levou um sangue alheio, mas o seu próprio sangue, que tem validade e garantias eternas (Hb 9:11-14). Nenhum querubim poderia impedir a entrada deste Homem. Pelo contrário, os querubins se alegraram por ver que, finalmente, um Homem digno em caráter e perfeito em redenção pagou o preço pelos pecados e comprou para Deus o direito de receber todos os que estiverem no Seu Filho.

Além do véu interior e da tenda, o outro lugar onde os querubins estavam presentes, simbolicamente, no Tabernáculo, era no propiciatório — que era a cobertura da arca da aliança. Em cada uma das extremidades do propiciatório, e formando uma só peça com ele, foram postos dois querubins de ouro (Êx 25:17-22; 37:6-9). As asas dos querubins tocavam umas nas outras, e o rosto de cada um olhava para baixo. Simbolicamente, estes querubins olhavam para a arca, como se estivessem averiguando o seu conteúdo, mas o propiciatório os impedia de enxergar aqueles objetos. Pensando no simbolismo destas coisas, podemos aprender verdades muito preciosas sobre a redenção que há em Cristo.

Os três objetos colocados dentro da arca eram: as tábuas da aliança, uma vasilha de ouro contendo o maná e a vara de Arão que floresceu (Hb 9:4). Cada um destes objetos, de uma forma positiva, nos ensina sobre as provisões espirituais que temos em Cristo. Mas de uma forma negativa estes objetos lembram os atos de pecados do povo, porque foram dados em ocasiões de rebeldia. As duas tábuas da Lei foram dadas num contexto em que o povo estava envolvido em idolatria (Êx 32). Moisés quebrou as primeiras tábuas da Lei e foi necessário lavrar outras duas (Êx 34:1), e estas últimas foram as que ele colocou dentro da Arca. O maná foi dado numa ocasião quando o povo, murmurando, desejou as panelas de carnes que tinham no Egito (Êx 16). A vara que floresceu foi dada depois da rebelião liderada por Coré, Datã e Abirão, que estavam insatisfeitos com a liderança sacerdotal estabelecida por Deus (Nm 16 e 17).

O simbolismo disso tudo é que enquanto os querubins olhavam para dentro da Arca, eles não podiam enxergar os pecados do povo e, consequentemente, não poderiam aplicar nenhum juízo ao povo de Deus. O propiciatório, que é uma figura de Cristo (Rm 3:25; I Jo 2:2; 4:10), ensinava aos querubins que aqueles pecadores que estão em Cristo estão seguros, “nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus” (Rm 8:1). Além disso, no dia da expiação, realizado uma vez ao ano, o sumo sacerdote aspergia sangue sobre o propiciatório, no meio dos querubins (Lv 16:14). Com isso, o Senhor estava mostrando aos querubins que o preço pela redenção daqueles que estão em Cristo já foi pago. William J. Watterson diz ainda:

“Contemplando, então, a arca, o propiciatório e os querubins, temos uma figura preciosa da nossa propiciação.

Olhando para o interior da arca, olhamos para dentro de nós mesmos, e vemos nossa carne: ingrata, insubordinada e idólatra! Olhando para os querubins, somos lembrados da santidade de Deus, e imediatamente percebemos o problema: como é que seres pecadores como nós podem se aproximar de um Deus santo, que habita entre os querubins?

A resposta está no propiciatório e no sangue da propiciação. O propiciatório cumpria duas funções; escondia os símbolos do pecado, e expunha o sangue da propiciação. Os querubins, por causa do propiciatório, não viam o conteúdo da arca — viam apenas o sangue.

Assim é uma igreja local. Se olharmos para dentro de nós mesmos, veremos os lembretes do pecado. Mas Deus nos vê no Amado, purificados pelo sangue do Senhor Jesus Cristo. Deus nos vê, hoje, como seremos na eternidade”.

Esta verdade sobre a nossa santificação posicional se torna ainda mais surpreendente quando lembramos que Satanás, o inimigo das nossas almas, era um “querubim, ungido para cobrir ... querubim cobridor” (Ez 28:14, 16). Ele tinha a função de sustentar o trono de Deus, vivia o mais próximo possível da presença de Deus e deveria, como os outros querubins, manter a santidade da habitação de Deus. Seu orgulho, porém, o levou à queda, e depois de perder a sua posição honrada, se tornou um feroz inimigo de Deus e de tudo o que se relaciona a Ele. Dia e noite este inimigo das nossas almas acusa os servos de Deus, mas quão surpreso ele deve ficar toda vez que o sangue de Cristo é apresentado como garantia da segurança eterna do Seu povo. Na mesma publicação citada acima, William J. Watterson continua:

“Imagine Satanás, ‘o acusador de nossos irmãos’ (Ap 12:10), chegando perante Deus, o Deus que habita entre os querubins, e acusando-nos pelos nossos muitos defeitos. Ele, que foi querubim antigamente, talvez lance em rosto daqueles que hoje são querubins da glória, as nossas falhas: ‘Vocês que são querubins, guardiões da santidade de Deus, não enxergam as falhas daquele povo?’ Quase podemos imaginar os querubins olhando para o Senhor, e declarando: ‘Senhor, nós não vemos nada daquilo com que ele acusa os Teus filhos. Nós somente vemos o sangue do Cordeiro, que para sempre os purificou de toda mancha!’”

A pessoa de Cristo e o sangue de Cristo são de um valor tão alto, que nem mesmo as criaturas mais próximas do trono de Deus, os querubins, podem ver algum resquício de pecado naqueles que estão seguros nEle. Esta é uma verdade tão sublime, que o ímpio não consegue entender e Satanás não pode aceitar. Mas nós cremos!


(Extraído do livro “Anjos”. Já disponível!)

sábado, 11 de novembro de 2017

Orações altruístas

Algumas orações nas Escrituras são verdadeiros desafios para todos nós. Orar é o dever de todo crente, mas nem sempre oramos com o “espírito” adequando. Pense, por exemplo, num irmão que precisa orar numa reunião “levantando mãos santas, sem ira nem contenda” (I Tm 2:8). Ele precisa controlar suas palavras e deixar sua raiva de lado para que possa orar por alguém que talvez o ofendeu. Outra situação difícil é quando oramos para que Deus dê para outra pessoa aquilo que nós mesmos não temos. Há alguns exemplos disto na Palavra de Deus, mas quero destacar pelos menos dois, aqui.

·         Abraão – pelo rei (Gn 20:7, 17)
Deus disse ao rei Abimeleque que Abraão era profeta e que oraria por ele. Logo depois Abraão orou e, “sarou Deus a Abimeleque, e à sua mulher, e às suas servas, de maneira que tiveram filhos”. Até àquela altura da sua vida, Abraão não tinha recebido o cumprimento da promessa de que ele e Sara teriam um filho. Entretanto, ele precisou orar para que Deus abençoasse e desse filhos a outros casais. Será que foi fácil para ele orar pela felicidade dos outros e ver sua oração ser atendida, enquanto ele mesmo não tinha filho? 

·          Jó – pelos seus amigos (Jó 42:8-10)
O Senhor falou com os amigos de Jó, dizendo: “Ide ao Meu servo Jó ... e o Meu servo Jó orará por vós; porque deveras a ele aceitarei”. Pense na situação de Jó. Ele precisou orar para que o Senhor fosse misericordioso com os seus três amigos e lhes favorecesse, enquanto ele mesmo estava numa situação tão deplorável. Será que foi fácil para ele orar pelo bem dos outros enquanto ele mesmo estava em completa miséria?

Certamente não foi fácil para estes dois homens passarem por estas circunstâncias. Enquanto oravam eles precisaram enfrentar a própria carne que, com inveja, desejava receber o que estavam pedindo para os outros. Eles tiveram de aprender a orar de forma altruísta, e deixar o egoísmo de lado enquanto pediam pelo bem dos seus amigos.

Todos nós já passamos por situações assim. É precioso ver que nossas orações pelos outros foram atendidas, e que o Senhor os beneficiou muito. Mas, sendo honestos, não foi fácil passar por isto. Como nos sentimos quando, orando, vemos que o Senhor deu a outros o que nós mesmos não temos ainda?

Entre tantos outros exemplos pessoais, lembro de duas situações que me ensinaram muito, enquanto precisei suportá-las. Quando eu era solteiro, a maioria dos meus amigos também era, e nós sempre conversávamos sobre a seriedade do casamento. Preocupado com eles, e eles comigo, orei muitas vezes para que o Senhor lhes desse um bom casamento, impedindo que errassem nesta decisão. O que aconteceu foi surpreendente. Cada um deles começou a casar e ... eu fiquei. Quando eu me casei, aos 28 anos, muitos deles já estavam casados e com filhos. Confesso que foi difícil passar por isso. Outra situação difícil pela qual passei foi depois de casado. Minha esposa e eu sempre desejamos ter uma grande família, e desde as primeiras semanas de casados já estávamos orando para que o Senhor nos desse filhos. Como sabíamos que outros casais também desejavam, começamos a orar por eles. E o que aconteceu? Outros casais começaram a ter filhos, e nós não. Novamente não foi fácil passar por isto, mas precisávamos aprender a lição.

Repare, entretanto, que nestes eventos que envolveram Abraão e Jó, a situação não permaneceu a mesma. Logo depois que Abraão orou, e Abimeleque e outros casais tiveram filhos, o próprio Abraão e Sara também tiveram o deles (compare Gn 20:17-18 com 21:1-3). De uma forma ainda mais impressionante, note o que é dito sobre Jó: “E o Senhor virou o cativeiro de Jó, quando orava pelos seus amigos” (Jó 42:10). Enquanto ele orava pelos seus amigos, o Senhor mudou a sua situação.

Estes detalhes da vida de Abraão e Jó nos ensinam que alguma coisa se torna diferente quando oramos pelo bem dos outros. Talvez não mude as nossas circunstâncias, mas pode mudar a nossa atitude frente a elas. Ao orar pelos meus amigos e vê-los seguindo de mãos dadas para a vida conjugal, consegui ficar feliz por eles, sabendo que tinham sido impedidos de errar, e isto me livrou de ficar amargurado. Ao orar por outros casais e vê-los abraçar seus lindos filhos, ajudou a minha esposa e a mim a nos alegrar pela felicidade deles, e isto nos impediu de nos sentirmos frustrados. 
Alguns anos depois, me casei, e o Senhor me concedeu alguém que jamais imaginei que poderia chamar de esposa. Poucos anos depois tivemos filhos, e o Senhor nos concedeu dois (por enquanto) como jamais achei que teria. 

Nunca é fácil passar por uma situação em que devemos orar para que Deus dê a outros o que nós mesmos não temos, mas aprendi que nunca devemos deixar de orar. Alguma hora, para nossa surpresa ou surpresa dos outros, alguma coisa se tornará diferente!