quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

Entregue a Satanás

Pelo menos duas vezes no NT, a Bíblia manda alguém ser entregue a Satanás. Por sua autoridade, a igreja em Corinto deveria entregar um homem a Satanás (I Co 5:5); e por sua autoridade apostólica Paulo entregou Himeneu e Alexandre a Satanás.

Agora, o que quer dizer “ser entregue a Satanás”? Por que alguém deve ser entregue? Qual a finalidade de entregar alguém a Satanás? Neste artigo, vamos tentar responder estas perguntas resumidamente. Se o leitor desejar uma explicação mais detalhada, recomendo consultar outras ferramentas confiáveis.


a) O que quer dizer “ser entregue a Satanás”?
A primeira vista, parece estranho que alguém seja entregue a Satanás. Mais estranho ainda é quando percebemos que quem foi entregue é um salvo. No entanto, isto não é uma ideia estranha na Bíblia. Deus tinha muito prazer em Jó e, por causa desse prazer, o Senhor permitiu que ele estivesse nas mãos de Satanás. Entregá-lo a Satanás não foi um ato de disciplina da parte de Deus; foi uma forma de mostrar que a opinião de Deus sobre aquele servo estava correta (Jó 1-2). Paulo, depois de receber muitas preciosas revelações, também recebeu um “mensageiro de Satanás”, que o impedia de se exaltar pelas coisas que recebeu (II Co 12:7).

Os dois casos de I Co 5:5 e I Tm 1:20 mostram pessoas salvas que cometeram atitudes pecaminosas e, por isso, teriam que ser entregues a Satanás. Nestes casos, foi um ato de disciplina. Ser entregue a Satanás nestes casos seria, primeiro, ser colocado para fora da comunhão da igreja local. Isso implicaria em pelo menos três coisas. Primeiro, nenhuma outra igreja o receberia, enquanto não houvesse arrependimento e tratamento com aquela igreja de onde saiu. Segundo, sendo que Deus protege cada igreja local (I Co 3:17), aquele que recebeu a excomunhão estaria privado desta proteção especial. Terceiro, o mundo com seu sistema é a esfera onde Satanás e seus anjos trabalham (Ef 2:2-3; I Jo 5:19), e o infrator estaria à mercê de um mundo controlado pelo inimigo de nossas almas.


b) Por que foram entregues a Satanás?
Nos dois casos mencionados acima, os infratores foram entregues a Satanás por pecados que cometeram. Em I Co 5:5, o homem mencionado ali se envolveu em imoralidade (abusava da mulher de seu pai). Em I Tm 1:19, 20, Himeneu e Alexandre blasfemavam. Tanto um caso quanto outro, prejudicava não somente a vida moral e espiritual dos infratores, mas prejudicava a igreja toda. Por isso, como forma de preservar o testemunho coletivo, deveriam ser excomungados.


c) Qual o propósito de entregar alguém a Satanás?
Talvez esta seja a pergunta mais importante deste artigo. Como já vimos, os dois casos mencionados no NT são de pessoas salvas. Tanto a igreja em Corinto quanto Paulo em I Tm 1 não tomaram esta decisão por mero prazer de disciplinar ou por crueldade. Havia propósitos sérios e espirituais envolvidos. Quais são estes propósitos?
Na Bíblia inteira, seja Deus tratando com a nação de Israel ou o Senhor Jesus tratando com a igreja, a finalidade da disciplina é sempre a mesma. Coletivamente, a disciplina de um indivíduo tem por finalidade preservar o grupo. Logo que um indivíduo comete um pecado, ele deve ser disciplinado o mais rápido possível, para que o seu erro não incentive outros a pecarem também e todo o grupo seja prejudicado. Além disso, a disciplina também visa a restauração do indivíduo. A igreja deve discipliná-lo com a intenção de que ele sinta o peso do seu erro e arrependa-se de suas atitudes. É isto que está em vista nos dois casos mencionados neste artigo.

No caso do homem em I Co 5, a finalidade da disciplina dele era “para destruição da carne”. Há muitas explicações para esta expressão. Mas antes de dar qualquer sugestão, convém lembrar que, na Bíblia, a palavra “carne” tem vários sentidos, dependendo do contexto. Por exemplo, a carne é um alimento (Rm 14:21), o corpo humano (II Co 12:7) ou a natureza pecaminosa que há em nós (Gl 5:16-21). Estes são apenas alguns de muitos outros exemplos do uso da palavra carne. Portanto, precisamos identificar corretamente o uso da palavra “carne” aqui em I Co 5:5. Alguns sugerem que isto quer que o homem poderia sofrer enfermidades no corpo ou até a morte. Mas quero sugerir que talvez a expressão esteja aprontando para outra coisa. Se pensarmos na palavra carne, aqui, como sendo a atitude pecaminosa que o homem cometeu, então este versículo está dizendo que o motivo por este homem ser disciplinado era para que sua atitude de envolver-se em imoralidade fosse acabada e ele, arrependido, pudesse voltar à comunhão da igreja. Se ele não fosse disciplinado, sua atitude pecaminosa permaneceria.
Creio que este homem de I Co 5 é o mesmo mencionado em II Co 2:1-11. Se for o mesmo homem, então vemos o efeito que aquela disciplina causou na vida dele. Ele não somente parou com sua atitude pecaminosa, como também sentiu tão profundamente o peso do seu erro que quase morreu de tanta tristeza.     

  No caso de Himeneu e Alexandre, a finalidade da disciplina deles era “para que aprendam a não blasfemar” (I Tm 1:20). Estes dois homens sentiriam tão profundamente o peso de terem sido colocados para fora da comunhão da igreja, que parariam com sua atitude de falar mal de Deus e da Sua Palavra, e se comportariam na igreja de uma forma mais reverente.

Além disso, convém enfatizar que em nenhum destes dois casos os homens perderiam sua salvação. Muito pelo contrário, eles seriam “salvos no dia do Senhor Jesus” (I Co 5:5).


É sempre triste quando uma igreja precisa disciplina alguém, seja qual for o grau de disciplina. Mas se houve pecados, é necessário disciplinar, para o bem da igreja toda e para a restauração do infrator.